Anarquia em Londres

Anarquia em Londres
Reprodução: Guardian

Encerraram-se no sábado os protestos violentos pela morte de um homem, supostamente assassinado a tiros pela Metropolitan Police em uma operação de apreensão de armas em Tottenham, no Norte de Londres, região pobre da cidade. No domingo e na segunda, o que se viu pelas ruas não foi um grito desesperado pedindo reparação e retratação pelo falecimento de um suposto inocente, e sim uma completa anarquia perpetrada por jovens que aproveitaram o momento de caos para saquear lojas e subjugar forças policias em diversos cantos da capital britânica.

À meia-noite de segunda para terça-feira no Brasil (4h da manhã em Londres), o clipe de Anarchy in the UK, da banda Sex Pistols, no YouTube, teve um incremento substancial de audiência. O primeiro comentário do vídeo era “Thumbs up if the London riots brought you here” (Em português, algo como “Dedão pra cima se os tumultos de Londres trouxeram você aqui”). 200 pessoas haviam concordado com a frase até aquele momento.

A letra da canção do grupo de punk rock britânico não é muito inventiva. Trata-se mesmo de um brado de fúria: I am an anti-Christ – I am an anarchist – Don’t know what I want – But I know how to get it – I wanna destroy the passers by – ‘Cos I wanna be anarchy.

Pois a revolta dos jovens londrinos não parece muito diferente. Talvez a Metropolitan Police tenha mesmo demorado em fornecer respostas à família de Mark Duggan e à comunidade. No sábado, antes de a violência principiar, houve um protesto pacífico, sucedido pela falta de respostas e consequente revolta. Mas certamente a morte de Mark Duggan não se configura como o único motivo para a rebelião.

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Anarquia em Londres
Protestos em março. Reprodução: Telegraph

Em março deste ano, Londres já havia pegado fogo. E em pontos ainda mais centrais do que os da anarquia dos últimos dias. No fim daquele mês, após cortes no orçamento empreendidos pelo governo britânico, um número estimado de 500 mil pessoas protestaram nas ruas centrais da cidade. Mais de 200 foram presas, por vandalismo e depredação de lojas. No dia 27, por exemplo, uma das lojas de departamento mais tradicionais, a Fortnum & Mason, foi invadida e pichada. Diversos outros estabelecimentos comerciais da Oxford Street tiveram vídros destruídos, paredes pichadas e objetos roubados. Os leões da Trafalgar Square, uma das praças mais turísticas e históricas da capital, serviram de palco para demonstrações de repúdio ao governo e ao partido conservador.

A crise realmente atingiu a capital britânica. As taxas de crescimento, reduzida, e desemprego, em 9%, surpreendem e impõem cortes no orçamento e diminuição do investimento em serviços sociais. Com isso, as filas dos Job Centres crescem, e alguns distritos da cidade reduzem em quase 60% a assistência social à população.

Além disso, a insatisfação com a polícia cresce devido aos erros da Scotland Yard. Jean Charles de Menezes, por exemplo, era um brasileiro inocente que foi morto a tiros em 2005. No mês passado, o chefão Sir Paul Stephenson deixou a Metropolitan Police por ligação com o escândalo dos grampos aos telefones de celebridades e políticos perpetrado por agentes do jornal News of the World, tabloide sensacionalista que fechou após as denúncias.

–       Pessoas perderam suas casas, seus negócios por violência sem sentido – afirmou o Prefeito de Londres, Boris Johnson, que encurtou suas férias e está a caminho da capital britânica, assim como o Primeiro-Ministro David Cameron.

Cameron pediu às famílias, nesta segunda-feira, que tirem seus filhos das ruas, “para que a polícia possa fazer o seu trabalho”. A tendência é que a repressão à violência cresça a partir desta terça, com mais homens destacados para o trabalho, além dos 1,7 mil agentes extras de domingo e segunda. Mas, assim como a perspectiva de repressão, o número de regiões com focos de violência também parece estar aumentando. Até agora, os maiores se localizaram em Hackney, Croydon, Peckham, Lewisham, Clapham e Ealing.

No último sábado, a falta de explicações sobre o caso de Mark Duggan  tornou a polícia e o status quo alvos da ira de quem já estava insatisfeito com muita coisa. Só que invadir a Boots e afanar produtos de beleza de madrugada não pode ensejar nenhum tipo de simpatia ou compreensão. Não é protesto, mas vandalismo, roubo e violência.

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